Merece comentários nesta
carta ao leitor o significado que percebemos da 64ª reunião anual da SBPC - realizada
no Maranhão. A edição deste ano teve como tema central Ciência, Cultura e Saberes
Tradicionais para enfrentar a pobreza, e trouxe à tona o enfrentamento de
nossos problemas sociais e econômicos a exigir o reconhecimento de um diálogo
constante entre os diversos saberes.
A mesa dedicada à relação dos
saberes tradicionais com a pesquisa científica, desenvolvimento de produtos e
processos para enfrentar a pobreza traduziu a existência de um Brasil diverso,
que necessita ser reconhecido e integrado, incorporado ao ambiente acadêmico e aos
esforços científicos de construção do conhecimento.
Segundo o antropólogo Alfredo
Wagner Berno de Almeida, da Universidade Estadual da Amazônia, “a emergência
das biotecnologias modernas, da mercantilização da biodiversidade e do
patrimônio genético mudou o jogo", conferindo valor econômico ao uso que
antes não era considerado, devendo os saberes tradicionais ser normatizados, a
fim de preservar e respeitar o direito desses grupos, o que está assegurado
na Convenção 169 sobre povos indígenas e tribais da Organização
Internacional do Trabalho (OIT).
Assim, há necessidade
premente de modernização da legislação nacional, de maneira a contemplar e
proteger essa herança para que seja incorporada à indústria de forma justa e
igualitária.
Já a profa. Vanderlan Bolzani,
da Unesp, reafirmou o conhecimento tradicional como uma valiosa fonte de
investigação científica e tecnológica. Diz Bolzani que o conhecimento sobre
plantas nativas em todas as culturas demonstra que elas podem ser benéficas ou
maléficas, e a sua transformação em mercadorias depende do desenvolvimento de
CT&I, hoje dominado por países europeus, pela China e pelos Estados Unidos.
O Brasil, afirma Bolzani, é
um mercado em potencial na exploração de plantas medicinais por ser rico em
biodiversidade, mas incipiente quando comparado ao mercado internacional, e
detendo ecossistemas que precisam ser investigados.
O grande problema colocado durante
a reunião da SBPC referiu-se à enorme precariedade da educação básica
brasileira, cuja educação científica é incipiente, evidenciando um desamparo
infantil concreto, mencionado pelo físico Sérgio Mascarenhas como um dos
problemas mais graves e profundos do sistema educacional.
Trata-se de uma idade muito rica,
onde o estímulo é fundamental e a criatividade da criança pode fazer dela um
profissional com excelentes ideias e propostas. “A base na educação infantil
garante um cidadão bem preparado, inclusive para enfrentar as adversidades de
seu país", afirmou.
O cientista e divulgador da
ciência, Antônio Pavão, diretor do Espaço Ciência do Recife, afirmou ser essencial
levar a pesquisa para a escola, de forma a "ensinar ciências fazendo
ciência. Queremos o estudante-cientista desde bem pequeno", declarou.
"A criança tem aquela característica de cientista de perguntar
sempre e ter resposta para tudo. Não tem cabeça fechada, é aberta à
argumentação. Mas quando cresce, deixa de ser cientista, porque a escola mata
isso dentro dela."
É emblemática a colocação
feita pela profa. Suely Druck (UFF) ao declarar que embora no Brasil nos
últimos anos o avanço da C&T tenha sido fantástico, o progresso na área de
ensino de ciências na educação básica é extremamente pequeno em relação à sua
necessidade, resultando na perda de muitas oportunidades por não ter uma boa
educação nesta área. No entanto, ela afirma, os países estão de olho no Brasil,
pois nenhum outro tem 50 milhões de jovens nas escolas e universidades, e
muitas empresas e universidades do exterior priorizam os sul-americanos que têm
mais facilidade de adaptação que os orientais. Para a professora, a exclusão
científica e todos os danos que ela causa precisam ser combatidos seriamente e aponta
que a sociedade brasileira aceita a exclusão, razão pela qual não caminhamos
mais rápido do que poderíamos caminhar.
Resta saber se tais falas
expressas pela comunidade científica e tecnológica brasileira irão ecoar e
promover e influenciar medidas e políticas necessárias à melhoria da educação
brasileira cujos reflexos são imediatos no desenvolvimento nacional da
CT&I.
Nenhum comentário:
Postar um comentário