terça-feira, 25 de setembro de 2012

A importância da tecnologia social

Paulo Kliass, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

A proximidade das eleições municipais traz para o centro do debate alguns aspectos que são recorrentes para a grande maioria da população, em especial para aqueles que moram nas capitais e nas grandes cidades. De acordo com levantamento dos órgãos especializados, alguns assuntos são prioritários: saúde, educação, violência e transportes.

Porém, um conjunto de assuntos de extrema relevância não entra nem mesmo na pauta da política em tempos de voto para a Presidência da República e para os integrantes do Congresso Nacional. Um exemplo típico é o trinômio “ciência, tecnologia e inovação” (CT&I), que tende a ser relegado a segundo ou terceiro planos, apesar de ser elemento essencial para qualquer debate a respeito de um projeto de nação.

A lógica subjacente ao tratamento que merece ser conferido ao CT&I é bastante específica. Por se tratar de uma área de despesa pública diferenciada, ela não pode ser submetida aos mesmos critérios de avaliação utilizados pelo setor privado e nem mesmo pelos demais setores do orçamento. Ciência, tecnologia e inovação são áreas em que, muitas das vezes, o gasto público deve ser encarado como investimento a fundo perdido e onde não cabe a aplicação da contabilidade restritiva de “retorno a curto prazo”. Os ganhos para o conjunto da sociedade com os resultados desse tipo de investimento são geracionais, de longo prazo.

Os volumes de investimento requeridos são expressivos e os eventuais resultados positivos tendem a demorar bastante para se apresentarem. Porém, há um conjunto amplo de setores e ações a serem desenvolvidas nesse domínio que implicam outro tipo de relação entre os agentes envolvidos com a produção de conhecimento, de produtos e de serviços na área. Trata-se da chamada “tecnologia social”.

O assunto é sensível e polêmico, comportando diferentes tipos de abordagem e de definição. De qualquer forma, até mesmo a estrutura do Estado reconhece a particularidade do enfoque: o próprio ministério setorial mantém em sua estrutura uma secretaria que se ocupa de “Ciência e Tecnologia para Inclusão Social”. Assim, pode-se perceber certa elasticidade na abrangência do conceito: desde a simples preocupação com o caráter social da utilização da tecnologia gerada até uma abordagem em que o processo de produção da tecnologia tenha em si mesmo incorporado a preocupação com a dimensão social.

Em termos concretos, temos uma série de exemplos em que o conceito de tecnologia social proporciona ganhos expressivos para a sociedade brasileira. E isso vai desde a mera recuperação de saberes tradicionais até a apropriação de conhecimento popular em grau de maior elaboração científica. Assim, priorizar a tecnologia social como política pública pode significar a opção por um processo científico que seja gerador de maior nível de emprego do que outro eventualmente mais sofisticado e de vanguarda na pesquisa. Ou ainda, adotar um determinado procedimento de tecnologia social como política de Estado pode representar a opção por um modelo de respeito a determinados padrões de incentivo à política regional e a não aceitação passiva de modelos universais destruidores de raízes sociais e culturais significativas.

Em termos gerais, a tecnologia social tende a propiciar um melhor nível de articulação com a base da sociedade organizada, por meio de estímulo ao associativismo e ao cooperativismo. Os recursos tecnológicos estão ali presentes e a própria organização da comunidade gera resultados de maior eficiência no nível local e de sua repercussão para ser apropriado pelo conjunto da sociedade.

A elaboração de um projeto de desenvolvimento sustentável deveria incorporar a preocupação com um maior espaço a ser conferido à tecnologia social. Mais do que nunca, o incentivo do Estado ao desenvolvimento das tecnologias sociais viria a cumprir com esse objetivo articulado de preservação do planeta e de melhoria da qualidade de vida de seus habitantes.

(O artigo completo foi publicado no sítio Carta Maior e pode ser acessado, na íntegra, em http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=5751&boletim_id=1353&componente_id=22406)

No boletim ViaInTc - Setembro de 2012

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