quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Lynaldo afirma que desconcentração regional é um problema do governo como um todo

O secretário-executivo da ABIPTI, Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque, afirma que a problemática da desconcentração regional em Ciência e Tecnologia é algo que deve envolver todo o governo federal e não somente o MCT. Lynaldo Cavalcanti declarou ainda que os Arranjos Produtivos Locais não tiveram a mesma força em 2003, comparado com o desempenho de 2001 e 2002.

Gestão C&T - O governo federal, em particular o MCT, tem dado especial atenção à desconcentração regional em C&T. Que avaliação o senhor faz das políticas implementadas nesse sentido?

Lynaldo Cavalcanti - Eu gostaria de destacar o discurso corajoso do ministro Roberto Amaral, que enfatizava a necessidade de implementação de ações e programas que levassem à desconcentração regional. Agora, resta saber se as agências do MCT, particularmente o CNPq, aceitaram o discurso de Amaral e, nas suas ações, durante 2003, estabeleceram programas e repassaram recursos nesse sentido.

Considero que ainda há muito por fazer. Na medida em que houve no CNPq um enfraquecimento da ação institucional e um retorno do processo de decisão feito exclusivamente por comitês assessores, que são compostos, em sua maioria, por professores das regiões Sudeste e Sul, muitas vezes ocorreram concentrações. Além disso, o próprio Pronex é um caso de programa que se tornou impraticável, tendo em vista a limitação de pessoas qualificadas em alguns Estados. Citaria, também, o Programa de Tecnologias Apropriadas que, na parte que se refere ao CNPq, praticamente não foi implementado.

Os Arranjos Produtivos Locais, que tiveram grande ênfase nos anos de 2001 e 2002, não tiveram a mesma força nesse ano.

Apesar disso, é preciso registrar a ação do Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas (Pappe) da Finep, que, apoiado pelo ministro Amaral, envolveu praticamente todas as Fundações de Amparo à Pesquisa em uma iniciativa de suporte aos pesquisadores que atuam nas pequenas empresas.

Em relação às ações do restante do governo federal, a Sudene e a Sudam não foram recriadas. É uma pena, pois esses projetos traziam fortes componentes de Ciência e Tecnologia. É preciso uma ação do governo como um todo na questão da desconcentração, não apenas do MCT.

Gestão C&T - O senhor fez um breve comentário a respeito do Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas (Pappe). Poderia fazer uma avaliação mais detalhada?

Lynaldo Cavalcanti - O Pappe envolve pesquisadores que atuam com ações de interesse de empresas. Em um País desigual como o nosso, certamente haverá dificuldades em algumas regiões ou em alguns Estados. Além disso, é importante a participação de outras instituições do sistema local de inovação, particularmente do Sebrae.

Também é preciso que a Finep faça um acompanhamento das iniciativas e ajude as instituições, principalmente aquelas mais incipientes, pois muitas não recebem os recursos previstos nas Constituições Estaduais.

Gestão C&T - Como o senhor avalia a criação no MCT da Secretaria de C&T para a Inclusão Social?

Lynaldo Cavalcanti - Acho que essa iniciativa tem que ser apoiada e preservada, pois se trata de uma inovação. É um setor, coordenado pelo senhor Jocelino Menezes, que atua na popularização da Ciência, nos Arranjos Produtivos Locais e nas Tecnologias Apropriadas.

Muitas secretarias tiveram que ser sacrificadas e houve até oposição de pessoas da comunidade científico-tecnológica em relação à Secretaria de Inclusão Social, mas, como eu disse, é uma Secretaria que está mostrando para que veio e tem hoje uma grande importância para a área de C&T.

Gestão C&T - Como o senhor recebeu a notícia da instalação do Instituto Nacional do Semi-Árido em Campina Grande?

Lynaldo Cavalcanti - Como paraibano de Campina Grande, evidentemente, fiquei muito satisfeito. Mas eu mesmo já tinha declarado antes que era melhor, em vez de um instituto do Semi-Árido, que se recriasse um programa de desenvolvimento científico-tecnológico para o Nordeste, como foi feito pelo CNPq, entre 1984 e 1990, com o apoio do BID, com investimentos de US$ 45 milhões, concentrado em cinco Estados – Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Ceará e Piauí – com enfoque multidisciplinar do Semi-Árido. Então seria melhor um programa atualizado, revisto e aperfeiçoado em vez de um instituto.

Além disso, até agora, o Instituto não teve sua base institucional estabelecida. Criou-se uma comissão para dirigi-lo, que está dando grande ênfase à biotecnologia, não sei bem porque razão.

Gestão C&T - Nos últimos anos, temos assistido à criação de Fundações de Amparo à Pesquisa e de Secretarias de C&T nos Estados e municípios. Em sua opinião, qual a importância desse processo?

Lynaldo Cavalcanti - Ressalvando-se os Estados que se anteciparam ao próprio governo federal, como São Paulo, esse é um processo que, no plano federal, começou em 1980, com uma ação do CNPq, por meio dos Sistemas Estaduais de C&T.

Essa iniciativa é praticamente interrompida e só é retomada pelo ministro Ronaldo Sardenberg, utilizando-se, como ele dizia, uma lógica regional na ação do Ministério. Essa ação é enfatizada e consolidada, inclusive com um discurso mais contundente e um repasse direto às fundações, embora ainda limitado.

De fato, desde 1999, foi muito positivo que todos os ministros de C&T cobrassem dos Estados esse compromisso. Muitas unidades federativas estavam inadimplentes e algumas tinham até regredido na área de C&T. Essa problemática demonstra uma questão cultural: os políticos não valorizam a Ciência e Tecnologia como um fator de desenvolvimento.

De alguma forma, hoje nós temos muitos Estados com uma secretaria exclusiva de C&T, mesmo que não seja só de Ciência e Tecnologia a área tem uma importância, tem um papel.

As FAPs ainda são muito desiguais, mas eu noto que cada vez mais a nomeação dos dirigentes leva em conta o mérito acadêmico e a experiência em C&T. São poucas as nomeações que são feitas como distribuição de cargos políticos.

Quanto aos municípios, há um movimento muito salutar, não é um movimento de grandes números, talvez isso até surpreenda porque grandes cidades não se preocuparam com o assunto e cidades menores estão dando grande importância para a questão, como, por exemplo, Itajubá, Campina Grande, Aracaju, Vitória etc. Esperamos que as ações do Fórum de Secretários Municipais, que têm o apoio da ABIPTI e da Finep, possam prosseguir e se consolidar.

Gestão C&T - Um problema que afeta vários Estados brasileiros menos desenvolvidos é a falta de recursos humanos qualificados que acaba levando a um menor número de projetos financiados nessas localidades. Como romper essa lógica?
Lynaldo Cavalcanti - Só existem duas soluções: atrair pessoas já qualificadas para esses Estados e fixá-las, pelo menos por algum tempo, ou ter programas de qualificação local ou em outros centros nacionais ou até no exterior.

Como reitor da Universidade Federal da Paraíba, de 1976 a 1980, eu levei para a instituição mais de 200 pesquisadores estrangeiros, qualificados nas mais diversas áreas do conhecimento. Eram profissionais da Índia, Argentina, Peru, Chile, Canadá e Alemanha. Além disso, a Universidade mandou muitas pessoas fazerem pós-graduação, principalmente por meio do Programa Institucional de Capacitação de Docentes (PICD), que existiu na Capes, de 1975 a 2000, e parece que hoje foi restabelecido com outro nome e com vagas muito limitadas.

Não há outra forma, é preciso atrair e fixar cérebros, porque sem neurônios ninguém vai fazer planejamento e gestão de C&T.

Gestão C&T - A ABIPTI é a secretaria executiva dos fóruns de Secretários Estaduais de C&T e das FAPs e apóia as ações do Fórum de Secretários Municipais de C&T. Na sua avaliação, qual tem sido a importância da atuação desses fóruns?

Lynaldo Cavalcanti - Os Fóruns, através de suas lideranças, que são eleitas, não só o presidente e o vice, mas os representantes regionais, estão presentes e atuantes junto ao governo federal. A presença do Fórum dos Secretários no CCT e em vários outros órgãos colegiados tem sido de grande importância para o fortalecimento dos Sistemas Estaduais de C&T.

Gestão C&T - O Congresso ABIPTI 2004 discutirá o tema Tecnologias para Inclusão Social: O Papel dos Sistemas de Ciência, Tecnologia e Inovação. Quais são as expectativas em relação a esse evento?

Lynaldo Cavalcanti - Esse Congresso de Minas Gerais talvez seja o nosso melhor evento, pois a participação local foi muito entusiástica. Várias instituições estão engajadas, inclusive a própria Secretaria de C&T mineira, a Fapemig e a Federação das Indústrias de Minas Gerais.

O número de trabalhos apresentados também é significativo e toda a equipe, da ABIPTI e de Minas, está bastante empenhada. Assim, acredito que o evento será de grande importância, inclusive pelo próprio tema.

Gestão C&T - A ABIPTI, em parceria com o MCT e Basa, desenvolveu o Projeto Plataformas Tecnológicas para a Amazônia Legal. Quais são os principais resultados e quais são as ações previstas?

Lynaldo Cavalcanti - A ABIPTI, a partir de 2000, foi convocada pelo MCT e pelo Basa para ser uma parceira em uma ação do Banco que ia ajudar os Estados da região Norte a organizar as Plataformas Tecnológicas.

Nós tivemos uma ação muito intensa em 2001 e 2002. Em 2003, com a mudança de governo, houve um período de transição que quase nos levou a interromper as atividades. Após uma audiência com o novo presidente do Basa, decidiu-se que vamos continuar com a realização de cursos de agronegócios, com a criação de núcleos de gestão tecnológica e, também, com as ações dos Arranjos Produtivos Locais.

Gestão C&T - Desde 1993, a ABIPTI oferece o curso para formação de Agentes de Inovação Tecnológica. Como esses recursos humanos estão sendo aproveitados nos sistemas estaduais e municipais de inovação tecnológica?

Lynaldo Cavalcanti - Esse programa surgiu da Comissão de Competitividade e Difusão Tecnológica (CCDT), inserida na Diretoria de Programas Especiais do CNPq, que foi extinta. Foi unânime a opinião do Sebrae, do Senai, do IEL, do CNPq e da Finep de que era preciso partir para um treinamento descentralizado de pessoas especializadas em gestão tecnológica.

Nós fizemos o primeiro curso em Brasília e, nos últimos dez anos, como o apoio não foi constante precisamos reduzir o número de programas. A nossa idéia era cobrir todo o território nacional, com exceção do Rio e de São Paulo, pois achávamos que esses dois Estados não precisavam, mas até agora ainda não fizemos cursos em Roraima, no Acre, no Rio Grande do Norte, em Santa Catarina e em Minas Gerais. Em compensação, realizamos dois cursos no Amazonas e no Rio Grande do Sul.

Agora, com o apoio do MCT, por meio da Secretaria de C&T para a Inclusão Social, nós esperamos retomar esse programa. Também estamos negociando com o Sebrae, junto com a Universidade Católica de Brasília (UCB), a realização de um programa de formação de Agentes de Inovação Tecnológica a distância.Boa parte das quase 600 pessoas treinadas pelo programa foi aproveitada pelo sistema Sebrae e por outros órgãos nos Estados - Secretarias, FAPs e institutos de pesquisa.

Entrevista publicada no informativo Gestão C&T Impresso, de dezembro de 2003, Nº 39, Ano 4

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