terça-feira, 23 de junho de 2009

Por que fracassa um APL


18/04/2009

Atualmente existem no Brasil mais de 300 experiências de promoção e desenvolvimento de Arranjos Produtivos Locais (APLs). A grande maioria dessas experiências vem sendo coordenada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e por federações empresariais. Mas, infelizmente, muitas delas, tal como concebidas, tendem a fracassar no médio prazo.

Um Arranjo Produtivo Local se define como um grupo de empresas altamente concentradas do ponto de vista geográfico, que trabalham direta ou indiretamente para o mesmo mercado final, com grau diferenciado de coesão e características comuns.

Nos últimos dez anos, as experiências se espalharam por todas as unidades da Federação, induzidas por uma política nacional (ou estadual) específica ou até mesmo por um certo modismo entre os formuladores de planos de desenvolvimento local ou microrregional. Mas, desde a concepção de distritos industriais proposta por Alfred Marshall no início do século passado, até as bem-sucedidas experiências dos distritos industriais da "Terceira Itália" no pós 2ª Guerra Mundial, não há como negar as potenciais vantagens competitivas das empresas protagonistas de um APL.

Michael Porter sinaliza, entre essas vantagens: maior eficiência na contratação da mão de obra e relação com fornecedores; acesso a informações especializadas; externalidades positivas; acesso a instituições e bens públicos; melhor motivação e avaliação do desempenho; estímulos à inovação etc. Cada uma dessas vantagens competitivas se destaca de acordo com o nível de organização e de desenvolvimento do APL, o qual pode variar das aglomerações produtivas de subsistência até as aglomerações produtivas de base tecnológica. A busca da melhoria de competitividade sistêmica dessas aglomerações tem estimulado a organização de novos APLs no País. Neste mês, por exemplo, o Sebrae de São Paulo está licitando trabalhos de consultoria para a estruturação de 15 novos APLs localizados em dezenas de municípios do estado.

Há diversos argumentos para prever o declínio de muitas experiências de APL em andamento no Brasil. Um APL tem como fundamento conceitual o modelo de concorrência com competição, em que se procura resolver problemas comuns a grupos de micro e pequenos produtores que isoladamente não teriam como resolvê-los. A principal fonte de competitividade são os elementos de confiança, de solidariedade e de cooperação entre as empresas, um resultado de relações muito estreitas de natureza econômica, social e comunitária. Como muitos APLs são construções artificiais arquitetadas pelas burocracias públicas e privadas ou pelo oportunismo empresarial para ter acesso aos novos mecanismos específicos de financiamento e de assistência técnica, fica claro que tende a ser curto o horizonte da sua sustentabilidade institucional.

Destaca-se, também, a absoluta ausência de uma Rede de Precedência na formulação de um projeto de APL, em quase todas as experiências em fase de execução no Brasil. Sem considerar a interdependência entre o sequenciamento, o ritmo e a intensidade das ações programadas que compõem a sua Rede de Precedência, corre-se o risco de se tratar o plano de ação como uma lista de benefícios que vai sendo percorrida indiscriminadamente, pressupondo-se que, se tudo que foi proposto é bom para os protagonistas do APL, se pode fazer o que for possível em qualquer cadência ou sequenciamento comandados por fatores aleatórios. Os resultados desses procedimentos normalmente podem ser inesperados, contraditórios e inconsistentes com o escopo e os objetivos do plano de ação do APL.

Enfim, um Arranjo Produtivo Local pode ser considerado adequadamente estruturado quando dispuser das seguintes características: um plano de ação plurianual; uma estratégia competitiva consensualizada; um ambiente entre seus participantes de cooperar e interagir para competir; um modelo de governança com gestão participativa e compartilhada; e um sistema de controle e avaliação com indicadores de processo e indicadores de resultados ou finalísticos. Esses procedimentos podem dar certa garantia de que as atividades e ações programadas não se transformem num exercício de voluntarismo tecnocrático, numa experiência fortuita de projetos de vitrine ou numa mobilização de esperanças comunitárias desencontradas e dispersas quanto aos seus objetivos de médio e de longo prazos.

por Paulo Roberto Haddad (economista, foi ministro da Fazenda)
Fonte: O Estado de S. Paulo - 18/04/2009

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